quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Monotrilhos colecionam falhas, atrasos e estão mais caros

21/09/2015 - O Estado de S. Paulo

Anunciado há seis anos pelo Metrô de São Paulo como uma solução para garantir a expansão da rede de transporte na região metropolitana, o monotrilho coleciona falhas e atrasos e está mais caro do que o previsto, o que, segundo especialistas, coloca em xeque o modelo implementado de forma pioneira no País. A empresa defende a adoção do sistema e aponta questões pontuais para os problemas.

Dos 38,6 km de linhas prometidos até 2015, apenas 7,5% foram concluídos. A construção de metade das 36 estações previstas nas linhas 15-Prata (Ipiranga-Cidade Tiradentes) e 17-Ouro (Morumbi-Congonhas), que já deveriam ter sido entregues, está congelada. E as obras da futura Linha 18-Bronze (Tamanduateí-São Bernardo do Campo) não têm mais prazo para começar, mais de um ano após a assinatura do contrato.

Na Linha 15-Prata, com trecho de 2,9 km em operação, os trens ainda não cumprem regras do edital de licitação, como a velocidade máxima exigida. O Estado exigiu que os trens circulassem a 80 km/h – velocidade que técnicos consideram fundamental para que o intervalo projetado entre as composições fosse cumprido – e, assim, atender à demanda de 48 mil pessoas por hora. Usando um aplicativo de monitoramento de trajetos, a reportagem fez dez testes e constatou que a velocidade máxima era de 67 km/h.

Com metade da obra travada por atrasos nas desapropriações, o Metrô revê até o número de trens que a linha terá. A compra feita para a linha foi de 54 trens. Mas a companhia admite que não terá lugar para guardar 20 deles, uma vez que não há previsão para a construção do Pátio Ragueb Chohfi, em São Mateus, na zona leste, fora do chamado “trecho prioritário” – parte da obra prometida até 2018.

Na Linha Prata há ainda a elevação de custo em até 105% em relação à primeira promessa da obra. Ela era orçada em R$ 3,5 bilhões (valores corrigidos pela inflação) em 2010, segundo informações divulgadas pelo governo à época. Mas deve custar cerca de R$ 7,2 bilhões. Para efeito de comparação, a Linha 6-Laranja (São Joaquim-Brasilândia), que terá 15,9 km de metrô convencional, deve custar R$ 9,6 bilhões – e tem o dobro da capacidade de transporte.

Na Linha 17-Ouro, travada por atrasos nas desapropriações no Morumbi, zona sul, nenhum trem da linha – prometida para a Copa – está em testes.

Mais incerta de todas, a Linha 18-Bronze teve o atraso oficializado há um mês, quando o Metrô publicou informe postergando o início da obra por um prazo de seis meses a até dois anos. Em agosto de 2014, durante a campanha eleitoral, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) havia afirmado que a obra começaria “imediatamente. ” Agora, o governo diz que não recebeu recursos esperados da União.

Perda. Os atrasos fazem especialistas questionarem o modelo. “Na medida em que o monotrilho demora tanto quanto o metrô para ser implementado e os custos por quilômetro se aproximam, esse modelo passa a perder o atrativo. As linhas 15 e 17 estão encaminhadas, seria um prejuízo enorme voltar atrás. Mas a Linha 18, que nem sequer começou, é o caso de reavaliar se é a solução mais adequada. Fizemos uma aposta cara e temos de avaliar se vale a pena”, diz Jaime Waismann, consultor em Engenharia de Transportes e ex-professor da Universidade de São Paulo (USP).

O presidente da Associação de Engenheiros e Arquitetos do Metrô, Emiliano Stanislau Affonso Neto, defende o modelo. “É uma solução para atender a uma demanda de média capacidade. ” Mas faz ressalvas. “O Estado decidiu fazer muitas linhas ao mesmo tempo. Mas manteve o mesmo número de técnicos supervisionando os trabalhos. Eles acharam que compensariam buscando técnicos no mercado (terceirizados). Isso se mostrou um erro. ”

Ministério Público investiga “má qualidade” dos projetos

A Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e Social do Ministério Público Estadual abriu, nessa quarta-feira, 16, dois inquéritos civis para apurar os “atrasos no projeto e sua má qualidade” nos monotrilhos das Linhas 15-Prata e 17-Ouro. O Metrô foi intimado a prestar esclarecimentos.

As investigações são desdobramentos dos depoimentos de um funcionário do Metrô, que foi ouvido pelo promotor Marcelo Milani por causa de outra investigação relacionada à companhia.

As informações colhidas motivaram o promotor a abrir inquéritos em separado, segundo informa portaria de instauração de inquérito da Linha 15.

Sobre esta linha, entre as suspeitas apontadas pelo promotor, está o fato de que o atraso pode estar relacionado a restrições do projeto “e do respectivo processo licitatório”.

Já sobre a Linha 17-Ouro, a portaria do inquérito afirma que as empresas responsáveis pela construção dos trens, a MPE, brasileira, e a Scomi, da Malásia, estariam, respectivamente, “em situação pré-falimentar” e “com dificuldades técnicas para entregar o que vendeu ao Metrô”. A reportagem procurou o grupo, e a resposta foi que o cliente – o Metrô – é que responde pela obra. No caso da Linha 17, a empresa também tem prazo de 30 dias para se manifestar.

Leia mais: http://www.revistaferroviaria.com.br/index.asp?InCdEditoria=1&InCdMateria=23825

Governo Alckmin estuda privatizar dois monotrilhos de SP

13/10/2015 - Folha de São Paulo

O governo de São Paulo estuda privatizar a operação dos dois monotrilhos da capital. A Folha apurou que a ideia é terminar as obras iniciadas e conceder à iniciativa privada as linhas 15-prata, na zona leste da cidade, e a 17-ouro, na zona sul.

Entre os modelos em estudo está o pagamento de um valor por passageiro a uma concessionária em troca da operação, como na linha 4-amarela do metrô. Além disso, a empresa também pode ficar responsável por comprar novos trens, por exemplo.

Na gestão Geraldo Alckmin (PSDB), a privatização é bem vista porque evitaria a contratação de mais funcionários e aliviaria o caixa do Estado.

A medida é apontada como solução para levantar a verba necessária à conclusão das duas linhas, que tiveram metade dos trajetos prometidos congelados pelo governo —sem definição sobre se, e quando, serão executados.

A concessão, que já foi anunciada para a linha 5-lilás, também enfraquece o Sindicato dos Metroviários, considerado grevista pela gestão. Funcionários de concessionárias não são representados pela entidade, que é contra as privatizações.

PROBLEMAS

A privatização é a mais nova aposta do governo para tentar salvar do fracasso sua opção pelo monotrilho.

Controverso pelo impacto urbanístico e pela segurança, esse modal ainda é muito pouco usado no mundo como meio de transporte de massa.

Teve um boom nas décadas de 70 e 80, caiu no ostracismo, mas ressurgiu, há alguns anos, sobretudo em países em desenvolvimento como China e Malásia —e Brasil.

Em São Paulo, foi adotado sob a justificativa de ter construção mais rápida e barata que um metrô convencional.

Na prática, porém, esses benefícios não se concretizaram. Quase seis anos se passaram desde o primeiro contrato, e as duas linhas em obras estão longe de ficar prontas.

Na melhor das hipóteses, em 2018, 17 de 36 estações prometidas estarão abertas e 21,9 km —de 44,4 km anunciados— serão entregues. O atraso em relação à previsão inicial passará de seis anos, no caso da 15-prata, e de quatro anos, no caso da 17-ouro.

Os custos das duas linhas também estão maiores do que os previstos inicialmente. Na linha 15, por exemplo, o preço apenas das fases em obras já subiu em R$ 300 milhões.

Outra linha planejada é a 18-bronze, que vai atender a região do ABC Paulista. O contrato foi assinado no ano passado, já prevendo operação privada. Mas não se sabe quando ela sairá do papel.

Era para ser rápido de implantar e mais barato, mas nenhuma das vantagens foi alcançada afirma Marcos Kiyoto, arquiteto e mestre em planejamento urbano.

Ele avalia que houve um excesso de confiança nas vantagens da tecnologia. É um sistema bastante peculiar, que não tínhamos domínio técnico no Brasil, e pouco domínio técnico no mundo.

O otimismo com o monotrilho era tão grande que, na década passada, Estado e prefeitura chegaram a cogitar a construção de 197 km de linhas elevadas, depois abandonadas ou alteradas.

Para Peter Alouche, especialista em transporte que trabalhou décadas no Metrô, faltou debate. Em artigo na revista Engenharia, ele diz que apresentações feitas pelo Metrô nunca responderam dúvidas que permanecem no consciente técnico coletivo.

Já Epaminondas Duarte Junior, escalado pelo Metrô para falar sobre o monotrilho, diz que o sistema é eficiente e está em sintonia com vários outros pelo mundo. Estudamos os sistemas do Japão e da Malásia antes de montarmos os projetos, diz.

Para ele, ainda que não substitua o metrô, cuja demanda é maior, o modal é fundamental para a integração da rede de transporte.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Linha do monotrilho de SP não tinha projeto nem orçamento, diz TCU

01/10/2015 - Folha de SP

A obra da linha 17-ouro, um dos monotrilhos de São Paulo, não tinha projeto básico e nem orçamento quando foi licitada, o que contraria a lei. É o que constatou auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União), aprovada nesta quarta-feira (30).

Um trecho da obra, de oito quilômetros, deveria ficar pronto para a Copa de 2014. Mas o projeto só estará terminado entre 2016 e 2017. O custo total do projeto de 18 quilômetros, que era de R$ 3 bilhões já passou para R$ 5 bilhões.

Analisando uma representação do Ministério Público, o TCU apontou que a concorrência para a obra poderia ser realizada num regime especial, em que o projeto final é feito depois da contratação.

Mas, segundo o órgão de controle, isso não permitia que a disputa fosse realizada sem um projeto básico e um orçamento, como determina a lei. O Metrô de São Paulo enviou documentos e planilhas ao TCU para tentar comprovar que tinha um projeto básico e orçamento da linha 17. Mas o tribunal entendeu que "as informações disponibilizadas junto ao edital de licitação, constantes dos autos, não atenderiam às exigências necessárias para sua caracterização como um Projeto Básico adequado. Logo, a Administração não teria condições concretas para aferir os preços praticados (...)".

Em outro trecho, o relatório afirmou que "verifica-se que as planilhas estimativas apresentadas pelo Metrô não atendem à definição de orçamento detalhado, parte integrante do Projeto Básico".

O relator do processo, ministro José Múcio, considerou contudo que o TCU não pode atuar para identificar e punir possíveis responsáveis pelas irregularidades, tarefas que seriam do Ministério Público e do TCE (Tribunal de Contas do Estado), para onde foram remetidas as conclusões do tribunal.

Quando for entregue, a linha 17 vai ligar a estação Morumbi ao aeroporto de Congonhas, na zona sul da capital.

Em nota, o metrô afirmou que prestará todos os esclarecimentos aos TCU. "O relator do TCU reconheceu a limitação de competência do tribunal para análise dos procedimentos licitatórios da Linha 17-ouro, considerando, em seu voto, a representação improcedente", informou a companhia.

MOBILIDADE

Em outro processo, também analisado nesta quarta-feira (30), o TCU encontrou falhas do governo federal na aprovação de projetos financiados com recursos federais no setor de Mobilidade Urbana, entre eles a linha 17-ouro.

De acordo com o trabalho, o governo prevê gastar mais de R$ 100 bilhões no setor nos próximos anos, mas não tem sistemas adequados para verificar a qualidade dos projetos feitos por Estados e municípios, que ficam responsáveis pelas obras.

De acordo com relatório do ministro Augusto Nardes, ao analisar projetos com custos superiores a R$ 1 bilhão em que Estados e municípios pediram recursos federais para realizar obras de transporte público, os técnicos apontaram que o Ministério das Cidades apenas referenda o que as cidades e estados querem, sem analisar se a proposta se adequa às políticas públicas do setor.

"A deficiência das análises fica evidenciada nas notas técnicas integrantes daqueles processos administrativos, uma vez que deixam de explicitar, de forma clara e desenvolvida, os motivos que permitiram o agente público concluir pela efetiva observância dos objetivos da política", informa o documento.

Além disso, o TCU apontou que as políticas públicas de incentivo à compra de carro, com subsídios ao preços dos combustíveis e dos carros particulares, não levaram em conta a priorização ao transporte público, piorando a qualidade do serviço principalmente nas regiões metropolitanas.

"País rico não é o que pobre anda de carro. É o que o rico anda de transporte público", defendeu o relator.